O livro é espaço, montagem de espaços
A criação do livro como forma de arte comporta um distanciamento critico em relação ao livro tradicional; contestando o recria se a tradição em tradução criativa, fazendo surgir novas configurações e formas de leitura. Com a mudança do sistema linear para o simultâneo, mudamos também a sistemática de leitura, não mais lidamos com símbolos abstratos, mas com figuras, desenhos, diagramas e imagens. Livro é montagem de signos, de espaços, onde convém diferenciar os diferentes tipos de montagem já que este procedimento “é o processo fundamental da organização dos signos icônicos". Distingue se basicamente três tipos de montagem, extensivos a toda arte contemporânea.
1. Montagem sintática: onde a mensagem estética é fortemente autoreferente, voltada para si mesma, dai seu caráter de ambigüidade, pois ela está basicamente organizada pela similaridade. Encontra se no cubismo e sobretudo em Mondrian como também na plástica minimalista. No cinema a montagem é sintática encontra se também em Eisenstein com o filme "O encouraçado Potemkin" e em "Limite" de Mário Peixoto, com claro predomínio da similaridade e do trocadilho visual. Em termos de livro de artista a montagem sintática está nos livros que tem seu suporte como forma significante, onde existe interpenetração entre a informação e o suporte como o caso do livro objeto, livro poema, ou ainda livro obra, isto é, que a estrutura espaço temporal do livro é tida em conta; nestas condições o livro é intraduzível para outro sistema, ou meio. O livro, neste caso permite o intercâmbio montagem das suas folhas criando e recriando estruturas poéticas (Colidouescapo). Permite estabelecer uma seqüência espaço temporal recuperando a informação anterior como memória (Poética Política) ou ainda explodir no espaço à procura de significados (Poemóbiles) ou ainda pode ser destruído no ato de folhar (Aumente sua renda) ou mesmo permitir a circularidade através de duas possíveis leituras: começo por qualquer uma das capas.
2. Montagem semântica: ou colagem que é o' "normal médio" do universo icônico (ficando entendido que esta classificação não representa uma escala de valores nem um estudo diacrônico). A montagem semântica (colagem) ainda que privilegiando a semelhança, tem tendência para a diferença, a contigüidade, como acontece no jornal, no cubismo de Picasso e Braque, na pintura de Klee e Kandinsky. Como exemplo de livros poderia se colocar "Alice no pais das maravilhas" de Lewis Carrol ilustrado por John Tenniel, onde o artista busca uma similaridade de significado, mas não de forma. Em William Blake ilustrando um poema de Edward Young ou mesmo Eugene Delacroix com as litografias que ilustram "0 Corvo" de Edgard Allan Poe, em tradução de Mallarmé (Paris, 1885).
3. Montagem pragmática ou bricolagem, onde a tendência é para a mistura e junção de elementos provenientes de outras estruturas estéticas. Rauschenberg vai para a bricolagem na mesma medida que o happening e a performance. É o que Marcel Duchamp propõe no seu livro "Boite en Valise", ao fazer um pequeno museu portátil com as reproduções em miniatura de seus "Ready mades”. Bricolagem existe na Praça da Sé de São Paulo, kitschizada pelas elites culturais com um amontoado de esculturas, assim como a estação Rodoviária da mesma cidade. A chamada "Mail Art” e seus suportes de repro e produção tendem a bricolagem, marcando uma forte tendência para a estética da recepção.
As publicações coletivas de trabalhos criativos, os livros "intermedia" e "documento" inserem-se neste tipo de montagem.
PLAZA. Julio. O livro como forma de arte (I). Arte em São Paulo, São Paulo, n.6, abr., 1982.
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