quinta-feira, 26 de junho de 2008

Paulo Bruscky

LIVROBJETOJOG0,1993
Botões de plástico, cerâmica e metal, zíper, linha de algodão e costura sobre tecidos de algodão 3 X 25 x 35,8 cm
Doação Ricardo Resende, 2001 -
Acervo do Museu de Arte Moderna de São Paulo


O pernambucano Paulo Bruscky desafia os rótulos, ou seja, qualquer definição é insuficiente para definir esse artista nascido em Recife, em 1949. Multimídia, inventor, educador, poeta, fotógrafo, arquivista, editor, curador; enfim, em duas palavras: um artista contemporâneo. Como artista, sua obra é tão vasta quanto múltipla. Desde o final dos anos 1960, vem desenvolvendo suas idéias em projetos de performances, objetos, esculturas, instalações multimídia, livros de artista, poesia visual, fotografias, filmes, vídeos, assim como em varias invenções. Foi um dos pioneiros da arte postal no Brasil, e sua atividade intensa na rede de arte postal resultou num dos mais importantes arquivos de arte conceitual e multimídia do Brasil, que inclui trabalhos do Fluxus, do grupo japonês Gutai, John Cage, entre muitos outros artistas significativos na história da arte contemporânea. Muitos dos seus livros de artista foram amplamente distribuídos pelo correio forma de circulação artística marginal completamente alheia ao mercado e ao sistema da arte oficial.

Se meios e técnicas não definem sua prática artística, a dicotomia centro/periferia tampouco esclarece a vasta e diversificada face de uma obra que, não por acaso, só muito recentemente vem sendo mais conhecida. Observa se, em sua trajetória, que sua poética caminha lado alado com uma busca quase quixotesca da ampliação das sensibilidades, sempre incluindo mais interlocutores. À margem do sistema oficial de legitimação, orienta se para as bordas, na direção de um descentramento total de emissores e receptores de suas mensagens artísticas. Nos projetos desse artista, cuja influência do espírito Fluxus é notável, o cotidiano, em suas mais simples e insólitas situações, é capaz de propiciar sempre novas experiências.

Com a consciência da perda de um encantamento originário do mundo, Bruscky tenta ressuscitar o homo ludens adormecido em cada um de nós. Destrona o hegemônico valor econômico e elege, como guia de sua poética, a imaginação e o jogo aliados à irreverência e ao humor.

Cada exemplar dentre as centenas de livros de artista que realizou nos meios e técnicas dos mais variados seja como múltiplo ou como livro objeto único é mais um terreno aberto à experimentação. Nos seus livros, o aspecto lúdico e a experimentação sensível, tátil e olfativa, são, mais uma vez, significativos. Muitos de seus livros dirigem se às crianças, mas também a uma quase arquetípica experiência de infância que guardamos por toda a vida.

O Livrobjetojogo (1993) é um livro costurado com retalhos de tecidos coloridos, em suas páginas prendem-se aleatoriamente zíperes e fechos de formatos diversos. Os botões sugerem os gestos cotidianos de abrir e fechar e solicitam a ação de quem com eles interagem. A leitura desse livro é feita pelas mãos, convidadas a brincar em movimentos guiados pelo acaso, libertas dos automatismos dos gestos cotidianos. A percepção tátil desvencilha se, assim, da funcionalidade exata das ações práticas e resgata o que de mais sensível pode haver no desejo imemorial de ler o mundo.

(texto de Cristina Freire, no catálogo de Obras comentadas do mam/sp)

Tem uma matéria no Jornal da USP a respeito da mostra Ars Brevis, e uma galeria de imagens de Paulo Bruscky. Uma entrevista e outro texto, sobre os vídeos experimentais, para quem quer saber mais sobre esta figura rara.

2 comentários:

Anônimo disse...

Amir.
O Paulo alem disto tudo é um pesquisador e historiador fantástico. Tomara que ele um dia pegue seu baú , de preciosidades e publique a correspondencia sua. Andou realizando vários livros com a obra do Vicente do Rego Monteiro, reunindo material que estava disperso, inclusive fitas com programas de rádio do Vicente, feitos na Europa. Sem falar em fac-similes,de livros do Vicente. Que também entendeu o livro como um objeto de arte, suas edições eram belissimas.
abraço
joão

Anônimo disse...

Amir.
Me correspondi apenas uma vez com o Paulo, no inicio dos anos 1980.Estava lançando um livro chamado AUTORETRATO, livro este que compilava grande parte de seus achados . Mas não era bem um livro impresso industrialmente, parecia ser artesanal. Muitos poemas visuais foram completados na própria página, depois dele impresso. Portanto cada livro era uma obra em si.
Na ocasião ele me mandou muitos panfletos e folders do que estava transando na época. Guardo isto tudo comigo. Já na década de 1980 me impressionava este aspecto multimidia dele, na verdade ele não cabe no papel, ele próprio também transformava-se em poema. Resumindo, impossivel catalogar o Paulo pensando nas duas dimensões do papel.
Neste tempo, infelizmente, ele era conhecido apenas na área de arte postal, o que éra uma pena, pois retardou seu reconhecimento nas outras áreas das artes plásticas. Porque a arte postal nunca foi muito considerada, digamos que era o marginalizada mesmo. Como também era o grafite e o próprio livro de artista. A valaorização do livro de artista é recente, pelo menos que eu saiba.
Viva o Paulo!
joão antonio