Objeto quase é o nome de um livro em que o formato reforça o sentido das imagens nele contidas. Formado por uma única folha de papel dobrada três vezes, o mesmo desenho é repetido em cada uma das 8 páginas, cada vez realizado com um pincel diferente. A mão acompanha o formato da página para desenhar um círculo (ou quase um círculo, o que justifica o título). A repetição neste caso funciona como uma série de aproximações para atingir o círculo perfeito.
O círculo é uma das figuras geométricas que fazem parte do vocabulário de formas básicas utilizadas para o desenho de letras.
Para Octavio Paz, a prosa, o relato, o discurso e a demonstração são lineares, têm um começo e um fim. A poesia, assim como a canção, o mito e outras expressões poéticas, sempre é auto-suficiente, o que corresponde à figura de um círculo, um desenho que remete a si mesmo e nunca termina.
Este tipo de desenho remete aos círculos desenhados pelos monges budistas Zen com um único traço. É realizado como um exercício de concentração, em que a unidade do pincel e da tinta se realiza de uma forma absoluta. A linha feita com o pincel ganha espessura, é figura e contorno ao mesmo tempo. O gesto do calígrafo estabelece o limite entre o dentro e o fora. O espaço branco que fica no interior do círculo faz parte do desenho, tanto quanto a tinta preta. Entre os orientais, a perfeição do círculo branco merece a admiração por colocar em evidência o vazio.
Para os calígrafos do Japão, o desenho de um círculo feito à mão sem o auxílio de nenhum instrumento é um exemplo de destreza e precisão – nada falta e nada excede.
A estrutura do livro repete o desenho de um círculo. Qualquer uma das páginas pode ser o começo ou o fim, dependendo da maneira como o livro é dobrado. Não existe diferenciação entre a capa e as páginas internas, a forma é o conteúdo.
(trecho da dissertação de mestrado Imagens Escritas, defendida na Unicamp em maio de 2007)
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